Após as prisões dos suspeitos de serem mandantes dos assassinatos de Marielle Franco e Anderson Gomes, peritos criminais do Rio de Janeiro afirmaram que a implicação de Polícia Civil no crime não surpreendeu e que há anos a estrutura de segurança no Estado tem menosprezado o trabalho técnico nas investigações.
O sindicato afirma que a falta de autonomia dos peritos fluminenses em relação à polícia compromete resultados das investigações. A demanda por mais autonomia é um pedido antigo dos peritos no Estado.
“Atualmente, 20 Estados da Federação (AL, AP, AM, BA, CE, ES, GO, MA, MT, MS, PA, PR, PE, RN, RS, RO, SC, SP, SE e TO) possuem Órgãos de Perícia Oficial total ou parcialmente desvinculados das Polícias Civis, o que, como se observa no caso de Marielle e Anderson, não é o caso do Estado do Rio de Janeiro”, diz a nota dos peritos.
O sindicato lembra de iniciativas nos últimos anos em prol da autonomia e da oposição à ideia. Diz que em 2010, um projeto foi criado para estabelecer a subordinação hierárquica dos peritos à Delegacia de Homicídios, primeiro na cidade do Rio.
“Esse projeto de peritos subordinados diretamente aos delegados titulares foi expandido para toda a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, fortemente apoiado e idealizado pelo delegado Rivaldo Barbosa à época”, dizem os peritos.
Então chefe da Polícia Civil do Rio quando dos assassinatos, Barbosa foi preso no fim de semana acusado de ser líder de uma organização criminosa que pretendia sabotar a investigação sobre as mortes.
Janaína Matos, perita criminal e vice-presidente do Sindiperj, cita um dos desafios práticos do trabalho pericial no Estado: a ausência de fotógrafos periciais, carreira que já tinha sido extinta, segundo ela, pela polícia quando Marielle e Gomes foram baleados e mortos em 2018.
Para compensar a falta de profissionais para fotografar corpos, a rotina tem sido peritos registrarem imagens com seus próprios celulares ou com câmeras próprias. No caso do homicídio da vereadora e de seu motorista, as imagens teriam sumido. “Não se sabe o paradeiro dessas imagens”, disse Matos ao Valor.
Outro ponto que ela cita como problema da subordinação dos peritos aos delegados. Nem sempre os policiais convocam peritos criminais imediatamente para a cena do crime. No caso Marielle, essa convocação tampouco ocorreu de forma imediata, disse Janaína Matos.
Filipe Teixeira, em nome dos peritos dos Rio de Janeiro, afirma que no Estado há uma lista de casos em que a falta de autonomia dos peritos é questionada e os assassinatos de Marielle e Gomes é mais um deles.
“Nada nunca efetivamente foi feito pelo Estado do Rio de Janeiro para modificar tal mazela. O que mais é preciso acontecer para avançarmos?”, questionam os peritos.
Os profissionais afirmam que cabe ao poder Executivo no Estado dar ou não mais autonomia à categoria.