Contrariando as expectativas pessimistas, a economia global segue mostrando uma notável resiliência, com um crescimento estável, embora desigual, e com a inflação desacelerando rapidamente, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), que divulgou hoje seu mais recente relatório “World Economic Outlook” (WEO). No entanto, o documento alerta para os desafios que persistem, como a crescente divergência no ritmo de crescimento entre os países e a necessidade das autoridades se manterrem alertas para a inflação, ainda acima das metas na maioria das economias.
“Apesar de muitas previsões sombrias, o mundo evitou uma recessão, o sistema bancário mostrou-se em grande parte resiliente, e as principais economias de mercado emergentes não sofreram interrupções súbitas”, aponta o FMI no WEO.
Com relação a pressão nos preços, o Fundo espera que inflação global caia de uma média anual de 6,8% em 2023 para 5,9% em 2024 e 4,5% em 2025, com as economias avançadas retornando às suas metas de inflação mais cedo do que as economias emergentes e em desenvolvimento.
“O crescimento resiliente e a desinflação mais rápida apontam para desenvolvimentos favoráveis na oferta, incluindo o desaparecimento dos choques de preços de energia anteriores, o notável aumento na oferta de mão de obra apoiado por fortes fluxos de imigração em muitas economias avançadas”, diz o relatório.
Em meio ao cenário positivo, o FMI estima que haverá menos danos econômicos da pandemia para a maioria dos países, especialmente para as economias de mercado emergentes, em parte devido ao crescimento robusto do emprego.
Para as economias avançadas, o relatório revisou para cima em 0,2 ponto percentual o crescimento em 2024, para 1,7%, em relação à projeção anterior. Em 2025, o crescimento se mantém em 1,8%.
A melhora na projeção para este ano reflete uma revisão para cima no crescimento dos EUA, onde espera-se um crescimento de 2,7% em 2024, antes de desacelerar para 1,9% em 2025 — refletindo uma queda na demanda agregada como resultado do aperto fiscal gradual e um enfraquecimento nos mercados de trabalho.
“O forte desempenho recente dos Estados Unidos reflete um crescimento robusto da produtividade e do emprego, mas também uma forte demanda numa economia que continua sobreaquecida”, observa Pierre-Olivier Gourinchas, economista-chefe do FMI.
O FMI espera uma modesta recuperação da zona do euro da baixa taxa de crescimento de 0,4% no ano passado para 0,8% este ano e para 1,5% em 2025. No relatório anterior, o crescimento da região tinha sido projetado para 0,9% neste ano. Para a Alemanha, o ritmo de recuperação foi revisado para baixo em 0,3 ponto percentual tanto em 2024 quanto em 2025, para 0,2 e 1,3%, respectivamente, em meio a um sentimento do consumidor persistentemente fraco.
Para os mercados emergentes e em desenvolvimento, espera-se que o crescimento seja estável em 4,2% em 2024 e 2025, refletindo a desaceleração das economias da Ásia. O FMI projeta que o crescimento da China deve desacelerar de 5,2% em 2023 para 4,6% em 2024 e 4,1% em 2025, com o fim do efeito positivo de fatores pontuais, como a retomada do consumo pós-pandemia e estímulos fiscais, em meio à persistente fraqueza no setor imobiliário.
“A economia da China continua afetada pela recessão no seu setor imobiliário”, observa Gourinchas, acrescentando que o inflar e desinflar do crédito nunca se resolvem rapidamente. “A demanda interna permanecerá fraca, a menos que medidas fortes abordem a causa profunda. Com a demanda interna reprimida, os excedentes externos poderão muito bem aumentar. O risco é que isto exacerbe ainda mais as tensões comerciais num ambiente geopolítico já tenso.”
Por outro lado, “muitas outras grandes economias de mercados emergentes apresentam um forte desempenho, beneficiando por vezes da reconfiguração das cadeias de abastecimento globais e do aumento das tensões comerciais entre a China e os EUA”, segundo Gourinchas. “A presença destes países na economia global está aumentando”, acrescentou.
Segundo o FMI, o riscos para o cenário econômico global diminuíram desde outubro de 2023. Com as pressões inflacionárias diminuindo mais rapidamente do que o esperado em muitos países, os riscos para as perspectivas de inflação estão agora também globalmente equilibradas.
“No lado negativo, novos picos de preços decorrentes de tensões geopolíticas, incluindo aqueles da guerra na Ucrânia e do conflito na Faixa de Gaza, poderiam, juntamente com a persistente inflação nos países com escassez de mão de obra, elevar as expectativas para as taxas de juros e reduzir os preços dos ativos”, alerta o FMI.
Com isso, o Fundo ressalta que as autoridades devem priorizar medidas que ajudem a preservar ou até mesmo aprimorar a resiliência da economia global, como para reconstruir os amortecedores fiscais, reverter a queda nas perspectivas de crescimento de médio prazo e fortalecer os quadros de política monetária, fiscal e financeira, especialmente para as economias de mercado emergentes.
“Trazer a inflação de volta à meta deve permanecer como prioridade. Embora as tendências da inflação sejam encorajadoras, ainda não chegamos lá. De certa forma, preocupa o fato de o progresso em direção às metas de inflação ter estagnado desde o início do ano. Isso pode ser um contratempo temporário, mas há motivos para permanecer vigilante”, diz o relatório do FMI.
As perspectivas de crescimento a médio prazo também são prejudicadas pela crescente fragmentação geoeconômica e pelo aumento de medidas restritivas ao comércio e de políticas industriais. “As relações comerciais já estão mudando, com potenciais perdas na eficiência. O resultado poderá muito bem tornar a economia global menos, e não mais, resiliente. Mas o dano mais amplo é para a cooperação global. Ainda há tempo de reverter isso”, observa Gourinchas.
Por último, destaca o FMI, serão necessárias grandes investimentos mundiais para garantir um futuro verde e resiliente ao clima. “Cortar emissões é compatível com o crescimento, como se viu em décadas recentes quando o crescimento passou a ter uma intensidade de emissões muito menor. Não obstante, as emissões estão aumentando cada vez mais. É preciso fazer muito mais, e deve ser feito com rapidez”, alerta o economista-chefe do FMI. “A cooperaçãomultilateral é necessário para limitar os custos e riscos da fragmentação geoeconômica e das mudanças climáticas, acelerar a transição para a energia verde e facilitar a reestruturação da dívida”, acrescentou ele.