O novo conjunto de regras para o Programa de Alimentação ao Trabalhador (PAT) causou uma indigesta divergência entre as principais empresas de benefícios de alimentação no país. A Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT) ingressou com uma ação na Justiça contra Caju, Flash, iFood Benefícios e Swile, companhias que operam no chamado “arranjo aberto” – que amplia a possibilidade de aceitação do cartão, por ser bandeirado. A entidade, que representa os interesses das incumbentes do setor (Alelo, Sodexo e Ticket), acusa as startups que trouxeram essa inovação ao mercado de “concorrência desleal”. No fim de janeiro, a 1ª Vara Empresarial de Conflitos de Arbitragem, do Tribunal de Justiça de São Paulo, julgou uma ação movida pela entidade como parcialmente procedente e condenou as startups ao pagamento de indenização (em valor a ser definido) por danos materiais.
A nova legislação, 14.442, de 2022, definiu um conjunto de mudanças ao mercado, como a implementação do arranjo aberto (interoperabilidade) e a possibilidade de portabilidade (o trabalhador poderá escolher qual empresa estará vinculada ao seu vale-alimentação/refeição), mas essas diretrizes ainda estão em fase de implementação pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Além disso, desde maio de 2023, ficou determinado também o fim dos chamados “rebate”, modalidade de desconto nos contratos utilizada no setor entre as operadoras de benefícios e as empresas que contratam o serviço pelo PAT.
As empresas citadas na ação movida pela ABBT estão aguardando o detalhamento da decisão para entrar com recurso. Antes da aprovação do novo sistema, a Justiça não previa a proibição do arranjo aberto. “A leitura que eu faço é de desespero de causa. Os incumbentes estiveram acomodados por muito tempo e estagnaram. Nós chegamos de uma forma totalmente inovadora, disruptiva, e isso os incomodou, já que não se preocuparam em levar facilidades para o dia a dia do RH”, disse Julio Brito, CEO da Swile no Brasil, ao IM Business. “Eles entraram com a ação pouco antes de maio de 2023, enquanto a nova legislação estava em um limbo para aplicabilidade. Antes do decreto, nenhum governo havia proibido que as empresas operassem no regime aberto.”
A mesma opinião é defendida pelo iFood Benefícios, que opera no PAT desde 2019. “Decisões judiciais anteriores, inclusive de tribunais superiores, já reconheceram a legalidade da operação, pois não há uma proibição específica quanto ao uso de arranjos abertos de pagamentos no âmbito do PAT. Portanto, não há uma previsão de data para início da sua vigência, como alega a ABBT na ação”, afirmou o iFood, em nota. “Novas operadoras, como o iFood Benefícios, trouxeram inovação e dinamicidade para o mercado de benefícios. As regras de modernização do PAT, como a portabilidade, incentivam a concorrência no setor, que ainda é extremamente concentrado, dominado por um grupo restrito de empresas.”
A ABBT entende, por sua vez, que “as empresas rés citadas estavam agindo em desacordo com determinadas disposições da Lei Federal n° 14.442, de 2022, incorporadas na Lei Federal nº 6.321, de 1976, que criou o PAT, e além do Decreto Federal n° 10.854, de 2021, ao introduzirem precocemente o arranjo aberto de pagamentos no programa”. Em nota enviada ao IM Business, a entidade diz que “distorções criam insegurança jurídica, desvio de finalidade e prejudicam o trabalhador.”
Nas contas da entidade, os vales-alimentação e refeição pagam em torno de 3 bilhões de refeições ao ano, sendo aceitos em mais de 800 mil estabelecimentos credenciados que geram 2 milhões de empregos.
Parte interessada na discussão, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes, a Abrasel, entende que as entrantes se aproveitaram de um vácuo legal na linha de que “tudo que não é proibido é permitido”. “Eu, pessoalmente, tendo a me alinhar com essa direção da ABBT. Entendo que as empresas que chegaram ao mercado testaram os limites jurídicos”, disse Paulo Solmucci, presidente da Abrasel. “Tivemos reuniões regulatórias sobre o tema onde o Ministério do Trabalho deixou claro que não poderia ser usado o arranjo aberto antes da implementação da lei.”
Brito afirmou que a Swile vai recorrer da decisão em primeira instância por entender que a medida é “injusta”. “Esse tipo de decisão é totalmente injusta e beneficia três grandes empresas, que hoje têm mais de 85% de participação de mercado”, disse. “Esse tipo de discussão de regulação aconteceu outras vezes, como no mercado de adquirência, quando a Cielo e a Rede tiveram que levar diferenciais para concorrer com as novatas daquele mercado. Para mim, a ABBT percebeu que estava perdendo espaço por não ter os mesmos diferenciais competitivos e resolveu levar para a Justiça, mas nós estamos em compliance com a legislação. Sempre estivemos.”
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