Na última quarta-feira (6), o Supremo Tribunal Federal (STF) retomou a discussão a respeito da descriminalização do porte de maconha paa diferenciar usuário de traficante.
Essa é uma pauta que se arrasta no plenário da Corte desde 2015 e nesta semana, chegou ao fim com 5 votos favoráveis a descriminalização e 3 contrários.
Principais pontos do debate
Apesar da discordância dos ministros a respeito da descriminalização, houve um primeiro passo para se chegar a um comum acordo envolvendo a fixação de uma quantidade de droga para ser usada como parâmetro na hora de diferenciar um usuário de um traficante.
Os ministros Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Rosa Weber (aposentada) e Luís Roberto Barroso fixam como critério quantitativo para caracterizar o consumo pessoal em 60 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas. O ministro Edson Fachin, apesar de entender pela inconstitucionalidade do dispositivo, não fixa um quantitativo, pois entende que o Legislativo é quem deve estabelecer os limites.
Outros três votos consideram válida a regra da Lei de Drogas. Os ministros Cristiano Zanin e Nunes Marques fixam, contudo, a quantidade de 25 gramas ou 6 plantas fêmeas para caracterizar o uso. Já o ministro André Mendonça delimita a quantidade em 10 gramas.
STF x Congresso Nacional
Ao mesmo tempo que a descriminalização da maconha entra no rol de temas polêmicos atuais e divide opiniões, sendo uma pauta comprada tanto pela esquerda progressista, quanto pela direita conservadora, a questão envolvendo o mérito do seu julgamento também é debatido no meio jurídico.
Especialistas ouvidos pelo iG
citam o termo ‘ativismo judiciário’ para abordar o motivo pelo qual a descriminalização está nas mãos dos magistrados do Supremo e concordam que é o que está acontecendo nesse momento.
“A função do STF é fazer o controle de constitucionalidade. Ele analisa se as leis seguem a Constituição. Por sua vez, o legislativo regula a sociedade por meio de normas inferiores a Constituição”, simplifica o mestre em Direito Constitucional Antonio Carlos Freitas Jr.
O especialista também analisa a forma como o debate está ocorrendo. “O problema é que os ministros estão baseando-se em valores abstratos e não em disposições completas da Constituição. O que acaba sendo juizo de conveniência. Não é função do STF decidir o que é melhor para a sociedade.”
Para Antonio Carlos, há dois problemas: a Corte discutir o que ele chama de ‘argumentos de mérito’ e a tentativa de regulação de normas muito especificas como, por exemplo, a quantidade liberada para porte. Isso, na concepção do advogado, é debate para o legislativo.
Na mira do enquadro
Um dos argumentos utilizados por quem defende a fixação de uma quantiade de cannabis para diferenciar usuário e traficante, é a possibilidade de frear um problema estrutural das apreenções e enquadros policiais: a prisão de pessoas pretas e pobres em detrimento de pessoas brancas e classe média.
O advogado criminalista Rafael Paiva reconhece que esse é um problema real, onde a maioria das pessoas abordadas por tráfico fazem parte de grupos sociais mais vulneráveis, mas para ele, somente a estipulação de uma quantidade de drogas para fazer essa diferenciação necessária entre quem vende e quem usa, não é suficiente.
“Estipular esse critério objetivo da quantidade não resolve o problema”, argumenta o especialista, que descreve os critérios subjetivos usados por juízes atualmente: “o local onde a droga foi encontrada, a forma de acondicionamento e se constava, por exemplo, uma quantidade de dinheiro junto ao produto que indique uma possível venda.”
Para Rafael, a situação atual obriga um olhar panorâmico sobre a questão. “Os critérios subjetvos aplicados hoje resolvem o problema de entender se a pessoa é usuária ou traficamente. Mas essa subjetividade mostra que os problemas atuais são inerentes ao preconceito e racismo da nossa sociedade”, argumenta, pontuando que a criação de um único critério, como o da quantidade de droga, não resolverá as questões sociais.